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228/2001案件
时间:2002-03-07  当事人:   法官:陳廣勝法官、賴健雄法官   文号:228/2001

Processo no 228/2001 Data: 07.03.2002

Assuntos : Contradi..o insanável da fundamenta..o.

Reenvio do processo para novo julgamento.

 

 

SUMáRIO

1. Existe contradi..o insanável da fundamenta..o quando se constata
incompatibilidade n.o ultrapassável, entre os factos provados, entre
estes e os n.o provados ou entre a fundamenta..o probatória e a
própria decis.o.


 Tal “incompatibilidade” deve ser “evidente” (fácilmente perceptível
por um homem médio), e “absoluta”, (n.o podendo ser ultrapassada
com recurso à decis.o no seu todo e às regras de experiência comum).

2. Nesta conformidade, verifica-se a assinalada contradi..o, se o Tribunal,
ao seriar a factualidade que do julgamento ressaltou assente, dá como
provado que o “1o arguido amea.ou a ofendida ... obrigando-a a passar
declara..o de dívida” e, posteriormente, em sede de enquadramento
jurídico- criminal, afirma que “n.o se provou que os arguidos” –
incluindo-se aqui o 1o arguido – “por meio de violência ou amea.a com
mal importante, constrangeram a ofendida a uma ac..o ou omiss.o”.
3. Perante o vício da “contradi..o” e n.o podendo o Tribunal de recurso
decidir da causa (sanando-o), imp.e-se a anula..o do julgamento
efectuado e o reenvio dos autos para novo julgamento, a efectuar nos
termos do arto 418o do C.P.P.M..


O Relator,

José Maria Dias Azedo


Processo no 228/2001

 

 

 

ACORDAM NO TRIBUNAL DE SEGUNDA INST.NCIA DA R.A.E.M.:

 

 

 

Relatório

 

1. No T.J.B. e em audiência colectiva, responderam os arguidos (1o) (A) e
(2o) (B), ambos, com os sinais dos autos.

 

 Ao (1o) arguido (A), era imputada a prática, em concurso real, de:

 - um crime de “amea.a” p. e p. pelo arto 147o, no 2 do C.P.M.;

- um crime de “usura para jogo” p. e p. pelo arto 13o da Lei no
8/96/M de 22 de Julho conjugado com o arto 219o, no 1 do
C.P.M.;
- um crime de “extors.o”, na forma tentada, p. e p. pelo arto 215o,
no 1 e art.os 21o e 22o, todos do C.P.M.; e,
- um crime de “coac..o” p. e p. pelo arto 148o do C.P.M..


 

Por sua vez, era o (2o) arguido (B) acusado da prática, também em
concurso real, de:


 - um crime de “extors.o”, na forma tentada, p. e p. pelo arto 215o,
no 1 e art.os 21o e 22o, todos do C.P.M.;

- um crime de “coac..o” p. e p. pelo arto 148o do C.P.M.; e,
- um crime de “invoca..o de perten.a a associa..o ou sociedade
secreta” p. e p. pelo arto 4o, no 1 da Lei no 6/96/M de 30 Julho;
(cfr. fls. 156 a 157-v).


 

***

 

Realizado o julgamento, decidiu o Colectivo:

 A) Absolver o (2o) arguido (B) da prática dos crimes pelos quais
vinha acusado;

 B) Absolver o (1o) arguido (A) da prática dos crimes de “amea.a”,
“coac..o” e de “usura para jogo”; e,

 C) Condenar o mesmo (1o) arguido (A), pela prática, em autoria e na
forma tentada, de um crime de “extors.o” p. e p. pelo arto 215o no 1 e artos
21o e 22o do C.P.M., na pena de (1) um ano e (9) nove meses de pris.o,
suspensa na sua execu..o por um período de (2) dois anos, com a condi..o de
n.o estabelecer qualquer contacto com a ofendida (X) durante o referido
período.

 

***

 

N.o se conformando com a decis.o que o condenou como autor da
prática de um crime de “extors.o” na forma tentada, dela veio recorrer o (1o)
arguido (A).

Motivou para concluir que:


“ 1a O presente recurso vem interposto do douto acórd.o que ,
condenou o ora recorrente, em autoria e na forma tentada, pela prática de
um crime de extors.o p. e p. pelo artigo 215o, no 1, conjugado com os artigos
21o e 22o, todos do CPM, na pena de um ano e nove meses de pris.o, embora
suspensa a sua execu..o por dois anos.

2a A factualidade apurada n.o conduz de modo algum à subsun..o
no tipo legal do crime de extors.o, pelo que a incrimina..o do arguido por
este crime mais n.o revela que uma errada subsun..o jurídica da matéria
dada como provada.

3a N.o est.o reunidos os elementos constitutivos e integradores do
crime de extors.o pois que, nos termos do disposto no artigo 215°, no 1, do
CPM, para o preenchimento deste tipo de crime é necessário o emprego de
violência ou de amea.a com mal importante.

4a N.o tendo o arguido actuado por meio de violência ou de
amea.a com mal importante, fica assim arredada a qualifica..o da conduta
do recorrente como prática do crime de extors.o.

5a A factualidade apurada n.o se mostraria ainda bastante para
justificar a decis.o de condenar o arguido pelo crime de amea.a uma vez que
também aqui existe uma lacuna no apuramento da matéria de facto
necessária a essa decis.o de direito.

6a A matéria de facto dada por provada permitia, quanto muito,
integrar a premissa de que houve um aviso, uma advertência, o que n.o pode
ser considerado idóneo para o preenchimento do tipo legal do crime de
amea.a.

7a O acórd.o recorrido fundamentou a decis.o condenatória em


matéria de facto insuficiente em virtude de ausência de elementos fácticos
pertimentes à subsun..o no tipo legal do crime de extors.o.

8a A insuficiência da matéria de facto ressalta do teor do próprio
acórd.o recorrido e imp.e no caso concreto a absolvi..o do recorrente.

9a O acórd.o recorrido enferma, ainda, de contradi..o insanável
quanto à fundamenta..o na matéria de facto provada e n.o provada, pois
que n.o pode dizer-se, a um tempo, que n.o há crime de coac..o por falta do
elemento constitutivo da violência e da amea.a grave; e por outro, condenar
o arguido no crime de extors.o, quando esse crime também integra esse
elemento constitutivo.

10a A contradi..o insanável da fundamenta..o ora apontada imp.e,
de igual modo, que o recorrente seja absolvido.

11a N.o era permitida, no caso concreto e à luz da lei, a leitura em
audiência das declara..es anteriormente prestadas pela ofendida perante o
Ministério Público, uma vez que qualquer contradi..o ou discrepancia do seu
depoimento em audiência com essas declara..es poderia ser esclarecida pela
mesma perante o Tribunal.

12a A leitura em audiência das declara..es prestadas pela ofendida
na Polícia Judiciária é estritamente proibida, por n.o se verificarem, sequer,
os requisitos taxativos constantes do artigo 337o (e do artigo 338o) do CPP
para que as ditas declara..es pudessem ser lidas.

13a Em julgamento só podem fundar a convic..o dos Juízes as
provas aí produzidas ou examinadas ou aquelas que, embora produzidas em
momento anterior, tenham sido lidas em audiência, na condi..o de que essa
leitura seja legalmente permitida.


14a O Tribunal fez assim uso de prova de valora..o proibida, com
desrespeito dos princípios do contraditório e da imedia..o da prova e em
flagrante infrac..o do disposto no artigo 336o do CPP.

15a Estamos, assim, perante um caso de utiliza..o de prova proibida,
no sentido de valora..o proibida de prova, a qual gera a nulidade do
acórd.o recorrido arguível até ao transito em julgado da decis.o e acarreta a
anula..o do julgamento.

16a A indica..o das provas que servem para formar a convic..o do
Tribunal destina-se a assegurar que a decis.o n.o assenta em meios de prova
proibida, como é claramente o caso de declara..es prestadas pela ofendida a
uma entidade policial, lidas em audiência.

17a A falta de indica..o no douto acórd.o recorrido daquele meio de
prova proibido constitui uma viola..o clara do disposto no artigo 355o, no 2,
do CPP, o que acarreta a nulidade da senten.a por aplica..o do artigo 360o,
al. a), do mesmo Código”; (cfr. fls. 228 a 238).

 

***

 

Respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público, e na
contra-minuta que apresentou, conclui nos termos seguintes:

“ 1- N.o é verdade que n.o se verificou a violência ou amea.a com
mal importante, elemento constitutivo do crime de extors.o.

2- O mal amea.ado n.o teria necessariamente que ser concreto
mas também pode ser abstracto consoante o circunstancialismo
fáctico.


3- O facto de o recorrente ser agente da PSP, de estatura forte,
perante a ofendida, nova imigrante, rela..es públicas de clube
nocturno, ter proferido palavras como “...suportar eventuais
consequências...” constitui, sem dúvida, amea.a com mal grave.

4- O mais evidente seria a desloca..o do arguido acompanhado de
mais três desconhecidos para o exigir do pagamento de uma
“dívida”.

5- Por outro lado, a doutrina entende que a amea.a, no crime de
extors.o, é mais abrangente, "n.o tem que ser para a vida ou
integridade física, pode também incidir sobre a honra, a
reputa..o, o crédito comercial, o nome profissional ou artístico,
a tranquilidade familiar ou pessoal, etc." (Nelson Hungria)

6- Pelo que, verificam-se todos os elementos constitutivos do crime
de extors.o, designadamente o de amea.a com mal importante.

7- O facto de n.o ter provado o crime de coac..o ( em rela..o à
assinatura de uma declara..o de dívida) n.o impede a
consuma..o do crime de extors.o.

8- Pois o meio de violência ou amea.a com mal importante nos dois
casos têm dolos específicos distintos.

9- Na audiência de julgamento, a testemunha contou uma vers.o
totalmente adversa à da prestada junto do M.P., pelo que é de
aplicar o art. 337° no3 al. b) do CPPM.

10- Conforme a interpreta..o do Recorrente o referido artigo
reduz-se numa "claúsula morta" nunca poderia ser aplicada.

11- O legislador pretende providenciar oportunidade para o
julgador comparar e analizar as duas vers.es e decidir segundo


o princípio de livre aprecia..o e em prol da descoberta da
verdade material.

12- Contendo uma men..o expressa de "reprodu..o" nas
declara..es do M.P., as da P.J. constituiu parte integrante da
primeira, pelo que n.o houve qualquer leitura das declara..es
prestadas junto das autoridade policiais.

 13- Tal método de “remiss.o” ou “reprodu..o” n.o é qualquer
quest.o jurídica mas apenas de ordem prática em prol dos
princípios de economia e celeridade processual.

14- Por esta raz.o, n.o carece de indica..o no douto acórd.o
recorrido, as declara..es da testemunha junto da P.J. porque
nunca foram lidas na audiência de julgamento.”

Pugna pela manuten..o do decidido; (cfr. fls. 241 a 253).

 

***

 

Admitido o recurso e remetidos os autos a esta Instancia, foram os
mesmos, em conformidade com o disposto no arto 406o do C.P.P.M., com
vista ao Ministério Público.

***

 

Em douto Parecer de fls. 260 a 265, opina o Ilustre Procurador Adjunto
pela rejei..o do recurso.

***

 

Proferido que foi o despacho preliminar e colhidos os vistos dos Exmos
Juízes Adjuntos, cumpre conhecer.

 


Fundamenta..o

 

2. Dos factos

 

Deu o Colectivo “a quo” como assente a matéria de facto seguinte:

“Em data n.o determinada, mas em Mar.o de 1997, a ofendida (X)
pediu ao 1° arguido um empréstimo de HK$20.000,00 .

O 1° arguido entregou-lhe HK$15.000,00.

Para a liquida..o da dívida, a ofendida pagou uma importancia total
de HK$30.000,00 ao 1° arguido.

Depois, o 1° arguido telefonou à ofendida ordenando-lhe a devolu..o
da importancia de HK$20.000,00 a título de despesas de telefone, dizendo
que caso n.o satisfizesse o pedido, iria suportar as eventuais consequências,
tendo isto provocado medo e inquieta..o à ofendida.

A ofendida devia ao 1° arguido cerca de sete a dez mil patacas de
despesas de telefone.

O 1° arguido deixou o número do aparelho de recado 4XXX e o número
de telemóvel 6XXX à ofendida, a fim de combinar a devolu..o da
importancia de HK$20.000,00.

Em data n.o determinada, mas no final de Janeiro de 1998, o 1°
arguido combinou à ofendida no lobby do Hotel Presidente, a fim de resolver
a "dívida" de HK$20.000,00, quando a ofendida ali chegou, encontrou o 1° e
2° arguidos, tendo aquele obrigado-a a passar "uma declara..o de dívida".


No dia 9 de Mar.o de 1998, o 1° arguido deslocou-se à casa da
ofendida, acompanhado mais três desconhecidos, para exigir o pagamento da
"dívida" HK$20.000,00.

O 1° arguido amea.ou a ofendida com inten..o obter enriquecimento
ilegítimo, obrigando-a a passar "declara..o da dívida".

O 1° arguido agiu livre, deliberada, voluntariamente.

Sabia n.o ser permitida tais condutas.

O 1° arguido é guarda da PSP e aufere o vencimento correspondente
ao índice 210.

é casado e tem a mulher e dois filhos a seu cargo.

N.o confessou os factos e n.o é primário.

O 2° arguido é guarda da PSP e aufere o vencimento correspondente
ao índice 260.

é casado e tem a mulher e um filho a seu cargo.

N.o confessou os factos e é primário.

 

N.o ficaram provados os seguintes factos: A ofendida perdeu todo o
dinheiro emprestado, o 1° arguido acompanhou a ofendida até ao
Restaurante Presidente, e disse-lhe que caso a ofendida n.o pagar a dívida
contraída, a mesma haveria de "desaparecer ou sumir de Macau", além disso,
o 1° arguido ainda disse à ofendida para pagar mensalmente uma
importancia de HK$5.000,00 como juro.


Em meado de Novembro de 1997, o 1° arguido deslocou-se a casa da
ofendida e exigiu-lhe entregar mais HK$40.000,00, alegado que a mesma se
encontrava a trabalhar como dan.arina e ganhava facilmente dinheiro, e
disse que caso n.o satisfizesse, podia ser morte.

Os arguidos disseram-lhe que caso a ofendida n.o pagasse a "dívida"
de HK$40.000,00 até no fim do mês de Mar.o de 1998, os arguidos iriam
mandar alguém lhe violar e atear fogo na residência da ofendida.

O 2° arguido alegou que ele era membro da associa..o secreta de "14
Kilates".

O 2° arguido agiu livre, deliberada, voluntariamente, amea.ando a
ofendida com inten..o de obter enriquecimento ilegítimo.

Sabia n.o ser permitida tais condutas.

*

Indica..o das provas que serviram para formar a convic..o do
Tribunal:

As declara..es dos arguidos em audiência.

As declara..es da ofendida prestadas em audiência e as prestadas no
Mo Po que foram lidas, sua aprecia..o crítica e comparativa.

As declara..es da testemunha agente da PJ que acompanhou todo o
processado.

Análise dos documentos colhidos durante a investiga..o”; (cfr. fls.
217-v a 218-v).


 

3. Do direito

 

No ambito do presente recurso, imputa o recorrente ao Colectivo “a
quo” os vícios seguintes:

 

(1) errada subsun..o jurídica da matéria de facto dada como provada,
(cfr. conclus.es 1a a 4a);
(2) insuficiência da matéria de facto para a decis.o, (cfr. conclus.es
5a a 8a);
(3) contradi..o insanável da fundamenta..o, (cfr. conclus.es 9a e
10a);
(4) uso de prova de valora..o proíbida, (cfr. conclus.es 11a a 15a); e,
(5) falta de indica..o de meio de prova utilizado para a forma..o da
convic..o, (cfr. conclus.es 16a e 17a).


 

Perante as assim identificadas maleitas que na opini.o do recorrente
padece o veredicto recorrido, e sendo também certo, n.o estar o Tribunal de
recurso vinculado a conhecer as quest.es que lhe s.o colocadas na (mesma)
ordem em que as indica o recorrente – neste sentido, cfr., v.g., o Ac. deste
T.S.I. de 31.01.2002, Proc. no 131/2001 – cremos que antes de mais, importa
decidir da sua “ordem de conhecimento”.

 


Nesta conformidade, e, afigurando-se-nos da análise feita – assim como
das alega..es orais produzidas aquando da realiza..o da audiência de
julgamento do presente recurso – poder-se concluir pela existência de
aparente “contradi..o insanável da fundamenta..o” no veredicto “sub judice”,
o que, a confirmar, implicará a anula..o do julgamento efectuado,
prejudicando-se, desta forma o conhecimento dos outros vícios assacados ao
Acórd.o recorrido, de imediato, sobre a mesma nos ocuparemos.

 

Assim, vejamos.

 

Tem esta Instancia entendido que existe contradi..o insanável da
fundamenta..o quando se constata incompatibilidade n.o ultrapassável, entre
os factos provados, entre estes e os n.o provados ou entre a fundamenta..o
probatória e a própria decis.o; (cfr., v.g., Acs. deste T.S.I. de 03.02.2000,
Procs. no 1261 e 1263; de 29.06.2000, Proc. no 101/2000; de 21.09.2000, Proc.
no 123/2000; de 08.02.2001, Proc. no 2/2001; de 14.06.2001, Proc. no 32/2001;
de 11.10.2001, Proc. no 146/2001; de 18.12.2001, Proc. no 96/2001-II e de
24.01.2002, Proc. no 159/2001).

 

Importa, ainda, ter presente que tal “incompatibilidade” deve ser
“evidente” (fácilmente perceptível por um homem médio), e “absoluta”, (n.o
podendo ser ultrapassada com recurso à decis.o no seu todo e às regras de
experiência comum).

 


“In casu”, e no que toca ao vício de contradi..o ora em análise, afirma
o recorrente que consignou-se no acórd.o recorrido que:

– “N.o se provou que os arguidos por meio de violência ou de
amea.a com mal importante, constrangeram a ofendida a uma ac..o ou
omiss.o, pelo que ser.o absolvidos do crime de coac..o”; e que,

– “Porém, quanto ao crime de extors.o, diz o tribunal que provou-se
que o 1o arguido tinha inten..o de conseguir para si enriquecimento ilegítimo,
amea.ando a ofendida para o efeito”, concluindo, apresentar assim o decidido,
“uma contradi..o insanável quanto à fundamenta..o na matéria de facto
provada e n.o provada, pois que n.o pode dizer-se, a um tempo, que n.o há
crime de coac..o por falta do elemento constitutivo da violência e da amea.a
grave; e por outro, condenar o arguido no crime de extors.o, quando esse
crime também integra esse elemento constitutivo”; (cfr. fls. 233 e 233-v).

 

Para além disso, constata-se, ainda que, em sede de “factos provados”,
(ponto “2” do Acórd.o; cfr. fls. 217-v) consignou o Colectivo “a quo” que “o
1o arguido amea.ou a ofendida com inten..o de obter enriquecimento
ilegítimo, obrigando-a passar declara..o de dívida”; (sub. nosso).

 

Perante o ora transcrito, que dizer?

 

Ora, afigura-se-nos – ressalvado o devido respeito por opini.o diversa –
que, de facto, tendo presente as afirma..es assinaladas e mesmo
ponderando-se, globalmente, no veredicto em crise, fica-se sem saber qual a
posi..o do Tribunal “a quo”.


Num primeiro momento, ao seriar a factualidade que do julgamento
ressaltou assente, dá como provado que o “1o arguido amea.ou a ofendida ...
obrigando-a a passar declara..o de dívida”.

Contudo, posteriormente, em sede de enquadramento jurídico- criminal,
afirma que “n.o se provou que os arguidos” – incluindo-se aqui o 1o arguido –
“por meio de violência ou amea.a com mal importante, constrangeram a
ofendida a uma ac..o ou omiss.o”.

 

Como já temos afirmado, bem sabemos que pode (e deve) o Tribunal de
recurso, (sempre que possível), com base no constante na decis.o submetida à
sua aprecia..o, tirar ila..es quanto a factos, clarificar quest.es pouco claras,
suprir e até mesmo rectificar erros materiais, (óbviamente, salvaguardando,
sempre, a legalidade da sua decis.o).

Todavia, perante a “contradi..o” (invocada) e assinalada, n.o vemos
maneira de a “clarificarmos” de forma a que se consiga alcan.ar, com a
necessária seguran.a e lógica, o sentido a atribuir às apontadas afirma..es
assim como, o raciocínio subjacente às mesmas

 

Nestes termos, insanável que é a “contradi..o” verificada (já que n.o
tendo havido pedido de renova..o de prova n.o pode esta Instancia decidir da
mesma contradi..o), e embora com contornos algo diversos dos invocados
pelo ora recorrente – o que de forma alguma impede o seu conhecimento, até
mesmo porque é oficioso o conhecimento dos vícios do arto 400o, no 2, do
C.P.P.M.; cfr. v.g., o Ac. do T.U.I. de 25.07.2001, Proc. no 11/2001– e, no
mesmo sentido, F. Dias in, “Para uma Reforma Global do Processo Penal


Português. Da sua necessidade e de algumas orienta..es fundamentais”,
Coimbra, 1983, pág. 240, Cunha Rodrigues in, “Recursos” no “Novo Código
de Processo Penal”, Coimbra, 1988, pág. 393 e, Maria Jo.o Antunes em
Anota..o ao Ac. do S.T.J. de 06.05.92, ambos, in Rev. Port. de Ciência
Criminal, Ano 4, Fasc. 1, 1994 – imp.e-se, a anula..o do julgamento
efectuado e o consequente reenvio dos autos para novo julgamento nos termos
do disposto no arto 418o do citado código; (na verdade, tendo o Tribunal de
recurso o “poder-dever” de fundar a “boa decis.o de direito” numa “boa
decis.o de facto”, inegávelmente”, é de se lhe “reconhecer” poder, mesmo
oficiosamente, conhecer das “insuficiências”, “contradi..es” ou “erros” do
arto 400o, no 2 do C.P.P.M.).

Refira-se, ainda, que atento os crimes pelos quais vinham o ora
recorrente e (seu) co-arguido (B) acusados, e, visto que se imputava aos
mesmos terem agido “de comum acordo e em conjuga..o de esfor.os,
amea.ando a ofendida com inten..o de obter enriquecimento ilegítimo, e
for.ando a ofendida a passar declara..o de dívida”, cremos dever o novo
julgamento ter como objecto os crimes aí (acusa..o) referidos, (de “amea.a”,
“coac..o” e “extors.o”), com excep..o do de “usura para jogo” p. e p. pelo
arto 13o da Lei no 8/96/M e arto 219o, no 1 do C.P.M. e de “invoca..o de
perten.a a associa..o ou sociedade secreta”, p. e p. pelo arto 4o, no 1, da Lei no
6/96/M de 30 de Julho, já que é de considerar n.o afectada pela contradi..o
verificada, o segmento da decis.o que sobre estes mesmos crimes recaiu.

 

Com o explanado, e prejudicado que assim fica o conhecimento das
outras maleitas apontadas ao Colectivo “a quo”, resta decidir.

 


*

 

Decis.o

 

4. Nos termos e fundamentos expostos, acordam, determinar o
reenvio dos presentes autos para novo julgamento, nos exactos termos
ora consignados; (cfr. arto 418o do C.P.P.M.).

 

Sem tributa..o.

 

Fixa-se, a título de honorários ao Ilustre Defensor Oficioso, o
montante de MOP$2.000,00.

 

Macau, aos 07 de Mar.o de 2002

José Maria Dias Azedo (Relator) – Chan Kuong Seng (com declara..o de
voto junto) – Lai Kin Hong (com declara..o de voto)

 

 

 

 

 

 

 


Recurso em processo penal n.o 228/2001

Declara..o de voto

Apesar de ter votado a favor a decis.o e os fundamentos principais dela
veiculados no douto Acórd.o que antecede, da pena do Mm.o Relator,
entendo dever deixar aqui expressa a seguinte declara..o, em rela..o aos
seguintes pontos concretos:

I

Em primeiro lugar, tendo em conta que:

– o tribunal ad quem só vai resolver as quest.es concretamente
postas pelos recorrentes e delimitadas pelas conclus.es da sua
motiva..o de recurso, transitando em julgado as quest.es nelas
n.o contidas (apud nomeadamente os Acórd.os deste Tribunal de
Segunda Instancia, de 17/5/2001, de 3/5/2001, de 7/12/2000 e de
27/1/2000, in Processos n.o 18/2001, n.o 130/2000, n.o 1220 e n.o
63/2001, respectivamente; e os Acórd.os do ent.o Tribunal Superior
de Justi.a de Macau, de 3/7/1996 e de 21/6/1995, in Processos n.o
431 e n.o 311, respectivamente), por um lado;
– e, por outro, nos Acórd.os deste Tribunal de Segunda Instancia,
de 17/5/2001 no Processo n.o 63/2001, de 21/9/2000 no
Processo n.o 127/2000, e de 7/12/2000 no Processo n.o
130/2000, afirmámos e seguimos, mesmo para os recursos penais,
a doutrina do saudoso Professor José Alberto dos Reis de que
“Quando as partes p.em ao tribunal determinada quest.o, socorrem-se,



a cada passo, de várias raz.es ou fundamentos para fazer valer o seu
ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a quest.o posta;
n.o lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou raz.es em que elas
se apoiam para sustentar a sua pretens.o.” (in Código de Processo
Civil anotado, Volume V – Artigos 658.o a 720.o (Reimpress.o),
Coimbra Editora, Lim., 1984, pág. 143.);


é de concluir, sem margem para dúvida, que o vício de “contradi..o
insanável da fundamenta..o” faz parte do objecto do presente recurso penal,
por ter sido posto pelo próprio recorrente – através da formula..o das
conclus.es 9.a e 11.a na sua motiva..o de recurso – a título de uma das
quest.es colocadas a este tribunal de recurso.

Assim sendo, cabe a este Tribunal resolver esta quest.o concretamente
posta pelo recorrente, a pedido deste e nunca a título de “conhecimento
oficioso”. E ao conhecer dela, n.o precisa de cingir-se aos argumentos
configurados pelo recorrente, mas sim recorrer a outros fundamentos, se for
o caso, isto tudo na esteira da doutrina e jurisprudência acima referida. Aliás, é
bastante frequente que os tribunais superiores, ao resolver concretamente as
quest.es a eles colocadas pelos recorrentes, adoptam fundamentos ou raz.es
divergentes das alegadas por estes, sendo, pois, casos de decis.o de recursos
“em fundamenta..o algo diversa da do(s) recorrente(s)” ou “em contornos
algo diversos dos invocados pelo ora recorrente”, nada havendo, pois, de
anormal nisso.

Daí decorre necessariamente que nem é necessário invocar, mesmo como
que a título acessório se n.o lateral, o suposto carácter oficioso do


conhecimento dos vícios do art.o 400.o, n.o 2, do CPP de Macau, como se
entendeu fazê-lo na parte final da fundamenta..o do Acórd.o antecedente (a
pág. 15 do mesmo).

Entretanto, e mesmo que se entendesse indispensável a formula..o, no
Acórd.o antecedente, do fundamento de “conhecimento oficioso dos vícios
do art.o 400.o, n.o 2, do CPP de Macau” em causa, sempre caberia observar
que n.o concordo com esse sentido de conhecimento oficioso dos vícios do
art.o 400.o, n.o 2, do mesmo diploma, por seguintes raz.es aqui transcritas e
adaptadas do erudito voto vencido de autoria do Mm.o Conselheiro Manuel
Castro Ribeiro do Supremo Tribunal de Justi.a de Portugal, integrante do
Acórd.o n.o 7/95 deste órg.o, proferido no Plenário da sua Sec..o Criminal
em 19/10/1995 no Processo n.o 46 580, do qual saiu fixada a jurisprudência
obrigatória de que: “é oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos
vícios indicados no artigo 410.o, n.o 2, do Código de Processo Penal [nota: artigo
essencialmente homólogo ao art.o 400.o, n.o 2, do CPP de Macau], mesmo que o recurso
se encontre limitado à matéria de direito.” (in Diário da República de Portugal, n.o 298,
I Série-A, pág. 8211 a 8213), necessariamente tidas aqui meramente como
doutrina (tal como o é esse Acórd.o n.o 7/95):

– “Na verdade, a clara redac..o do n.o 2 do artigo 410.o [homólogo ao n.o 2
do art.o 400.o do CPP de Macau], conjugada com o disposto nos artigos 412.o, n.os 1
e 3, e 430.o, n.o 1 [homólogos aos art.os 402.o, n.os 1 e 3, e 415.o, n.o 1, do CPP de
Macau, respectivamente], e o seu confronto com o artigo 403.o, n.os 1 e 2 [homólogo
ao art.o 393.o, n.os 1 e 2, do CPP de Macau], apontam no sentido de os “vícios” em
causa só poderem justificar o reenvio do processo (artigo 426.o) [homólogo ao art.o
418.o, n.o 1, do CPP de Macau] quando sejam invocados “como fundamentos do


recurso”; e isso estará em sintonia com a mens legislatoris, enquanto se atribui aos
sujeitos processuais, como “recorrentes”, uma inequívoca co-responsabilidade no
bom e rápido êxito final da causa, nomeadamente consentindo-se-lhes a limita..o
do recurso nos amplos termos do artigo 403.o [homólogo ao art.o 393.o do CPP de
Macau] e impondo-se-lhes apertadas regras na motiva..o, que, além do mais, terá
de enunciar especificamente os fundamentos do recurso e formular conclus.es de
acordo com o artigo 412.o, n.os 1 e 2 [homólogo ao art.o 402.o, n.os 1 e 2, do CPP de
Macau].

A meu ver, n.o seria de invocar o disposto no n.o 3 do artigo 403.o [homólogo
ao n.o 3 do art.o 393.o do CPP de Macau] em favor da fixada jurisprudência, por isso
que a restri..o ali cominada aos limites do recurso pressup.e a “procedência” dele,
enquanto o eventual conhecimento oficioso dos “vícios” previstos no artigo 410.o,
n.o 2 [homólogo ao art.o 400.o, n.o 2, do CPP de Macau], com a subsequente
determina..o do reenvio do processo, implicará, necessariamente, que se n.o
conhe.a do objecto do recurso.”

– “Entendo, ainda, n.o ser decisiva a invoca..o do artigo 426.o [homólogo ao
art.o 418.o, n.o 1, do CPP de Macau], uma vez que ele apenas visa esclarecer os
efeitos dos “vícios”, naturalmente quando destes se conhe.a por servirem de
fundamento ao recurso nos termos do artigo 410.o, n.o 2 [homólogo ao art.o 400.o,
n.o 2, do CPP de Macau].”

Ademais, e como uma “à parte”, cabe notar ainda que apesar de o douto
Acórd.o do Venerando Tribunal de última Instancia de 30/7/2001, do seu
Processo n.o 11/2001 (onde está em causa apenas um tema decidendo de foro
cível), invocado no Acórd.o antecedente, defender o sentido do carácter


oficioso do conhecimento dos vícios do art.o 400.o, n.o 2, do CPP de Macau,
num outro aresto desse mesmo órg.o topo da hierarquia dos tribunais da
R.A.E.M., com data anterior, de 7/2/2001, no seu Processo (de recurso penal)
n.o 14/2001, está a pronunciar-se, porém, no sentido da delimita..o do
objecto do recurso penal pelas conclus.es da motiva..o do recorrente, bem
como da inaplicabilidade, a título subsidiário, do art.o 650.o do CPC de Macau
aos eventuais casos de verifica..o dos vícios previstos no art.o 400.o, n.o 2, als.
a) e/ou b) do CPP, nos termos seguintes:

“... só nos limitaremos a resolver as quest.es concretamente postas pelo
recorrente e delimitadas pelas conclus.es da sua motiva..o de recurso, transitando
em julgado as quest.es nelas n.o contidas” (cfr. a pág. 79 do aresto);

“... aos eventuais casos de verifica..o da “insuficiência para a decis.o da
matéria de facto provada” e/ou de “contradi..o insanável da fundamenta..o” no
acórd.o recorrido nos termos do art.o 400.o, n.o 2, als. a) e/ou b), do CPP, nunca se
aplica, a título subsidiário, o art.o 650.o do Código de Processo Civil de Macau
(CPC), com a epígrafe de “Insuficiência da matéria de facto e contradi..o na
decis.o de facto”, que preceitua que: “1. Se entender que a matéria de facto pode e
deve ser ampliada para fundamentar a decis.o de direito, ou que ocorrem
contradi..es na decis.o de facto que inviabilizam a decis.o de direito, o Tribunal de
última Instancia manda julgar novamente a causa no Tribunal de Segunda
Instacia.// 2. O Tribunal de última Instancia fixa logo o regime jurídico aplicável ao
caso; se, por insuficiência da matéria de facto, ou contradi..o na decis.o de facto, o
n.o puder fazer, fica a nova decis.o que o Tribunal de Segunda Instancia proferir
sujeita a recurso para o Tribunal de última Instancia, nos mesmos termos que a


primeira.”, dada a auto-suficiência do processo penal nesta matéria nos termos
acima observados (cfr. o art.o 4.o do CPP).” (cfr. a pág. 81 a 81v do aresto.)

II

 Por fim, entendo útil esclarecer melhor na fundamenta..o do Acórd.o
antecedente os termos circunscritos pelos quais haverá que ser feito o novo
julgamento na Primeira Instancia, por comando da letra e espírito da parte
final do art.o 418.o, n.o 1, do CPP de Macau, através, por exemplo, da
coloca..o das seguintes palavras logo a seguir ao fim do penúltimo parágrafo
da parte de fundamenta..o do Acórd.o (correspondente ao primeiro
parágrafo da pág. 16 do mesmo):

 “devendo o novo julgamento restringir-se à matéria fáctica acusada pelo
Ministério Público na parte apenas correspondente aos crimes de “amea.a”,
“coac..o” e “extors.o”, ou seja, a partir do 6.o parágrafo da pág. 156v dos
autos (com os dizeres: “... no meado de Novembro de 1997, o 1.o arguido
deslocou-se a casa da ofendida e exigiu-lhe entregar mais ...”) até ao fim da
acusa..o pública.”

 Macau, 7 de Mar.o de 2002.

 O 1.o Adjunto,

 Chan Kuong Seng

 

 

 

 


Recurso no 228/2001

Declara..o de voto

 

Votei os fundamentos e a parte decisória do Acórd.o antecedente que
considera verificado o vício de contradi..o insanável, determinativo da
anula..o do julgamento e consequentemente do reenvio para novo julgamento.
Subscrevo integralmente o ponto I da mui douta declara..o de voto do Exmo
Juiz Chan Kuong Seng, quanto à quest.o do conhecimento oficioso ou n.o
dos vícios previstos no arto 400o/2 do CPPM, que continuo a entender n.o
constituir objecto do presente recurso por o vício de contradi..o insanável ter
sido efectivamente invocado pelo recorrente.

 

 R.A.E.M., 07MAR2002

 

 Lai Kin Hong

 

 

 


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